Vinícius Sassine
Publicação: 15/11/2010 06:25 Atualização: 15/11/2010 07:36
Investigadas por três anos por uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado e suspeitas de praticar irregularidades com o dinheiro público, oito organizações não governamentais (Ongs) continuaram a ser financiadas e a firmar convênios com a União nos últimos dois anos. As transferências de recursos e os gastos diretos do governo federal com essas entidades chegam a R$ 22,17 milhões em 2009 e em 2010. Neste período, as Ongs já respondiam a acusações de mau uso do dinheiro, repassado por meio de convênios anteriores. Mesmo assim, a União firmou novos convênios com quatro dessas entidades, no valor de R$ 6,7 milhões.
Entidades sem fins lucrativos, cujos dirigentes são ligados ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), também continuaram a ser irrigadas com dinheiro público, mesmo com a existência de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigar desvios de recursos. O governo federal gastou em 2009 e em 2010 (a CPMI foi aberta no ano passado e encerrada no mês de julho) mais de R$ 18,4 milhões com Ongs ligadas ao MST. Novos convênios publicados nesses dois anos preveem repasses de R$ 14,86 milhões.
O Estado de Minas fez os dois levantamentos com base nas informações divulgadas no Portal da Transparência, atualizado pela Controladoria-Geral da União (CGU). Os repasses a Ongs envolvidas em suspeitas de irregularidades ou ligadas ao MST diminuíram depois de as constatações de problemas no uso do dinheiro, mas não cessaram, como constatou a reportagem. As entidades analisadas foram investigadas e citadas no relatório final da CPI das Ongs, encerrada na semana passada no Senado. No caso das associações, cooperativas e centros de capacitação ligados ao MST, a análise dos repasses do governo levou em conta uma lista elaborada pela Ong Contas Abertas em março do ano passado. Nela aparecem 43 entidades cujos dirigentes desempenham alguma função no movimento dos sem-terra. Boa parte delas continua a ser financiada pelo governo federal.
Festa do Peão Entre as quatro Ongs citadas no relatório final da CPI e que continuaram a firmar convênios com a União, a principal beneficiada é a entidade Os Independentes, responsável pela Festa do Peão de Barretos (SP). Mesmo investigada, a entidade assinou três convênios com o Ministério do Turismo este ano e mais dois no ano passado, no valor de R$ 5,7 milhões. O dinheiro deveria ser utilizado em três diferentes eventos em Barretos – o maior montante é para a Festa do Peão. Mas, conforme o próprio Ministério do Turismo, a prestação de contas de pelo menos um convênio foi insatisfatória.
Em nota enviada ao EM, a assessoria de comunicação do ministério informa que a prestação de contas do convênio firmado para a realização do 7º Barretos Motorcycles deixou de apresentar alguns documentos essenciais, necessários para a comprovação da correta aplicação do dinheiro público. "O convenente foi notificado a apresentar documentação complementar sob pena de inscrição no cadastro de inadimplentes", informa a nota.
Outros dois convênios, para a realização da Festa de Barretos (são quase R$ 2,5 milhões), ainda dependem de análise pelo Ministério do Turismo. Por causa do "atraso" para a liberação do dinheiro, a vigência de um dos convênios foi prorrogada até 20 de dezembro. Os Independentes teriam até o dia 13 deste mês para apresentar a prestação de contas do outro convênio. Como foi um sábado, e por causa do feriado de hoje, o último dia para a prestação de contas é amanhã.
"No momento da assinatura dos convênios não havia qualquer impedimento legal para tanto", justifica o Ministério do Turismo. O senador Raimundo Colombo (DEM-SC), governador eleito em Santa Catarina, chegou a pedir a quebra dos sigilos bancário e fiscal da entidade, como parte dos trabalhos da CPI das Ongs. Segundo o relatório final da CPI, o Tribunal de Contas da União (TCU) instaurou dois processos, em 2006 e 2007, para apurar a aplicação de dinheiro da União na Festa do Peão de Barretos. A quantia em análise é de R$ 1,4 milhão. "Desde 1999, nenhuma Ong de Barretos surge na contabilidade pública como destinatária de recursos para a promoção anual da festa. Em 2006, Os Independentes recebem R$ 2,93 milhões", cita o relatório final da CPI. O EM tentou ouvir os representantes da Ong, mas a assessoria de imprensa da entidade não deu retorno até o fechamento desta edição.
Repasses sob suspeita
Organizações não governamentais (Ongs) investigadas por supostas irregularidades continuaram a receber dinheiro da União nos últimos dois anos:
Entidades citadas na CPI das Ongs
Transferência de recursos do governo
São repasses feitos depois de a assinatura prévia de convênios. Mesmo sob suspeita, as transferências continuaram:
2009: R$ 14,44 milhões
2010: R$ 6,08 milhões
Total: R$ 20,52 milhões
As entidades: Finatec, Unitrabalho, Instituto Uniemp, Os Independentes, Fundação de Aprimoramento e Desenvolvimento de Recursos Humanos do Amazonas
Gastos diretos do governo
O governo contrata uma entidade, geralmente por meio de licitação, e faz os pagamentos diretamente à contratada:
2009: R$ 1,23 milhão
2010: R$ 408 mil
Total: R$ 1,64 milhão
Algumas entidades: Finatec, Instituto Uniemp e Os Independentes
Novos convênios
Mesmo com as investigações em curso, a União firmou novos convênios com as Ongs. Os valores são os seguintes:
2009: R$ 3,18 milhões
2010: R$ 3,52 milhões
Total: R$ 6,7 milhões
As entidades: Finatec, Os Independentes, Unitrabalho e Federação das Associações do Perímetro Irrigado Jaguaribe
Fonte: Levantamento do EM no Portal da Transparência do governo federal
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