Em campanha no Triângulo Mineiro pelo sucessor, Aécio encontrou tantoprefeitos frustrados com sua exclusão da disputa presidencial quanto queixosos dos atrasos nas obras do PAC no Estado.
Detentor no plano estadual de uma aprovação a sua gestão semelhante à obtida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no país, o governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB) compete com o lulismo pela posse dos 14 milhões de votos em Minas em uma maratona de viagens e anúncios de obras. A movimentação de Aécio e dos aliados do presidente culminou na semana passada em Uberaba, no Triângulo Mineiro, na tarde de sexta-feira, em que tanto o governador quanto o ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias (PT) estavam na cidade, cumprindo agendas separadas.
Em Uberaba, o prefeito Anderson Adauto (PMDB), um dos coordenadores da campanha do ministro das Comunicações, Hélio Costa, recebeu tanto a Aécio quanto a Patrus, mas a competição entre as esferas federal e estadual foi mais explícita em Uberlândia, a maior cidade da região: no dia 3 de março, cinco dias antes da passagem de Aécio e do vice-governador e seu candidato à sucessão Antonio Anastasia pela cidade, o vice-presidente José Alencar esteve no município, para anunciar uma obra que ainda não existe: a duplicação da BR-050, entre Uberlândia e a divisa entre Minas Gerais e Goiás. Quando a licitação ocorrer e a obra começar, deve envolver recursos de R$ 274 milhões. Estavam presentes os aliados de Lula na região, como os deputados federais Elismar Prado e Odair Cunha, ambos do PT. O prefeito de Uberlândia, Odelmo Leão (PP), não foi.
Na cerimônia cinco dias depois na Prefeitura de Uberlândia, Aécio anunciou um pacote de investimentos, inclusive outra obra rodoviária que não passa de um projeto: o asfaltamento de 106 quilômetros entre Uberlândia e Campo Florido, com edital lançado esta semana. Odelmo estava presente com a base local de Aécio, composta, entre outros, pelos deputados federais João Bittar (DEM), Marcos Montes (DEM) e Nárcio Rodrigues (PSDB). Ninguém da base lulista apareceu.
A competição mostra que não é evidente a perspectiva de reedição do voto "lulécio", desta vez como "dilmasia", ou seja, o voto no candidato do PT à Presidência e do PSDB ao governo mineiro, que marcou as eleições de 2006. Naquela ocasião, parte da base de apoio de Lula, inconformada com a aliança entre PT e PMDB, aderiu ao aecismo. Entre os aliados do governador mineiro, dissidências da base federal ainda são mal recebidas.
"O Anastasia precisa ser eleito com composições éticas, e não apenas para ganhar. Ele tem que compor com quem vai governar. O Aécio pode ser bom de conversa, conciliador, no plano administrativo. Mas na eleição, tem que ser cada qual na sua trincheira", afirmou Odelmo Leão. O próprio governador repele o possível alinhamento. "Quem está comigo, vai estar com Serra. Este negócio de Dilmasia é uma bobagem", afirmou.
Anastasia está percentualmente com cerca de metade das intenções de voto de Dilma, mas conta com a vantagem de assumir o governo no próximo mês, em função da desincompatibilização programada por Aécio para concorrer ao Senado. E o chamariz de novas obras é amplamente usado para garantir adesões. Em Divinópolis, o governador chegou a anunciar um programa que deverá ser lançado pelo seu sucessor: a construção de estradas que irão interligar as regiões econômicas do Estado, uma proposta que Aécio chamou de "links" faltantes, "na ausência de um nome melhor", conforme falou.
As peregrinações de Aécio e Anastasia estão longe de se converterem em comícios de clima eleitoral. Geralmente transcorrem em ambientes fechados ou de difícil acesso, com plateia formada quase que exclusivamente por pessoas que estão ali a trabalho: assessores, políticos, jornalistas e seguranças. E os dois estão blindando suas bases contra investidas alheias: em apenas duas visitas, a Uberlândia e Divinópolis, entre os dias 8 e 11 de março, Aécio conseguiu para Anastasia o apoio de 43 dos 49 prefeitos das duas regiões.
A agenda administrativa é um invólucro frágil para justificar os encontros. Em Uberlândia, ambos anunciaram a liberação de recursos para obras que já estão em curso, mas ainda longe da inauguração, como o hospital municipal local, que é o maior em construção no Estado, ou comemoração a simples publicação de editais, cujas obras, na melhor das hipóteses, começam no segundo semestre.
Será muito difícil para a oposição acusá-los de campanha antecipada: não há nos discursos menções diretas às eleições e a presença de Anastasia nas solenidades sempre se justifica pelo fato do vice estar se preparando para assumir o governo no próximo mês.
Nas viagens pelo Estado, Aécio e Anastasia seguem um roteiro: os primeiros a falar são os anfitriões, o prefeito ou o parlamentar local de maior expressão, como o deputado estadual Wander Borges (PSB) em Sabará, o deputado estadual Domingos Sávio (PSDB) em Divinópolis ou o prefeito Odelmo Leão em Uberlândia. Deles se ouvem palavras de agradecimento. Não raro, são feitas comparações entre o autoproclamado dinamismo estadual e a alegada letargia do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) federal.
Em Sabará, na região metropolitana de Belo Horizonte, onde Aécio entregou um bloco cirúrgico no dia 22 de fevereiro, uma faixa cobrava a falta de liberação de recursos para obras de infraestrutura por parte da Caixa Econômica Federal. "A Caixa deixa muito a desejar", disse Borges, em tese um aliado do Palácio do Planalto.
Anastasia em seguida discursa em tom superlativo, procurando assumir a imagem de quem toma nas mãos o manche de um avião em velocidade cruzeiro. "O ano deveria ter 800 dias, para que este governo pudesse inaugurar uma obra por dia, e ainda faltariam obras produzidas por esta verdadeira locomotiva", afirmou o vice em Sabará. Como em outras ocasiões, não faltaram adjetivos como "nosso timoneiro", "grande líder", "gigante de qualidade única" e "exemplo para o mundo" entre os apostos de Anastasia ao titular do cargo.
Os discursos de Aécio sempre começam com longas saudações. O governador chega a levar 15 minutos cumprimentando os presentes mais ilustres e sempre discursando em torno de quatro ideias mestras: menciona que se trata de uma despedida; destaca a importância dos aliados ("triste de quem acha que resolve tudo sozinho. Este palanque é um resultado de nossas alianças", disse, em Sabará); comenta a seguir a importância de algumas de suas realizações, estejam ou não relacionadas com o evento; e termina afirmando que se sente honrado em "deixar o governo nas mãos limpas do professor Anastasia".
A viagem de quinta-feira a Divinópolis, cidade de 200 mil habitantes a 120 km a oeste de Belo Horizonte, foi a maior evidência de que a política em si se sobrepõe ao "show de inaugurações" mencionado por Anastasia. O dia de ambos começou com o recapeamento da pista do aeroporto municipal, asfaltada no governo Newton Cardoso, em 1988. Em seguida, Aécio e Anastasia foram a um terreno capinado na periferia da cidade, onde foi montado um palco para a inauguração do que é pouco mais do que uma ideia: o governador anunciou a construção futura de um hospital regional com 230 leitos. Na falta de uma maquete, governador e vice contemplaram uma planta do projeto do hospital, orientados pelo secretário estadual de Saúde, Antonio Jorge.
Após passarem pelas obras de um viaduto, Aécio e Anastasia terminaram em um palanque montado no Clube Estrela do Oeste, na companhia de Débora Lyra, a miss Minas Gerais, "uma beldade", segundo Anastasia, "na companhia de homens feios", de acordo com o governador. A bela loira de 1m80cm e pernas torneadas à mostra era o único elemento alheio à política em um salão composto por prefeitos, parlamentares, assessores e jornalistas.
Sem povo, o evento era uma argamassa da base municipal do poder aecista. Compareceram 23 dos 25 prefeitos do Vale do Itapecerica, a microrregião de Divinópolis, sendo apenas dois tucanos, além dos dois deputados federais da região, ambos do DEM, Jaime Martins Filho e Vitor Penido. Todos juraram apoio a Anastasia. O último fez a única menção ao sonho frustrado de Aécio. "Ainda tenho esperança que o PSDB nacional tenha um pouquinho de juízo e pense que o melhor para o Brasil é Aécio Neves", afirmou, sob palmas protocolares.
Ao responder Aécio fez menção apenas ao seu esforço para que "Anastasia possa dar continuidade aos compromissos adequados". Terminava a sessão de discursos e iniciava o coquetel no mezanino, para a mesma plateia de cerca de 300 pessoas que assistiam ao ato. Atrás salão, transcorria normalmente a aula vespertina de hidroginástica. Em um determinado momento, as alunas entoaram o coro: "Aécio, cadê você? Vim aqui só pra te ver!"
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